quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Convencional


Sem palavras devorando-nos,
madrugadas insones transformadas impossíveis existências,
cerrados no ascensor contemporâneo.

Viemos de outros tempos e vivemos neles,
desconhecidos a querer tocar o céu,
sabemos quanto querer mas não nos lembramos.

Subsiste a memória do corpo: trabalhemo-la.

Conseguimos trocar as palavras escritas em gestos anunciados,
olhos abertos (ao contrário) para o sonho entrar,
sequências adivinhadas em movimento.

Somos todos os tempos - jogamos neles,
pedaços sem memória una, antropofágicos,
sentimos (quando queremos) para esquecer.

Permanece a memória do espectáculo: celebremo-la.

Pontos de cruz tropeçam-nos até ao encontro,
roubamos lágrimas instantâneas, explodimos surdas gargalhadas,
lambemos cicatrizes invisíveis, trocamos máscaras verosímeis.

As cortinas são cerradas e o sonho desaparece connosco,
os outros são longe desse instante sem pessoa(s),
vai-se a luz temerária do efémero único.

Resiste a memória do ofício: suportemo-la.


M. Lisboa: 2014

Bar do Teatro Taborda - cidade de Lisboa (fotografia: jp_pombas)

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